Logo
Homeganeado
Sebastián Ariel Cuattrin

Sebastián Ariel Cuattrin

modalidade

Canoagem Velocidade

data e local de nascimento

06/09/1973

Rosário , Argentina

BIOGRAFIA

Diante do pódio, durante a cerimônia de premiação da prova K-1 1000 metros nos Jogos Pan-americanos de Havana, em agosto de 1991, um adolescente de apenas 17 anos, abriu o coração para o seu técnico e disse: “Eu queria estar no pódio!”

Consciente de que o sonho de seu atleta era completamente possível, Carlos Bezerra, o treinador, respondeu: “Treina mais que você vai estar no lugar deles na próxima”.

“Eu vou estar lá. Em algum desses degraus, eu vou estar lá!” prometeu o canoísta brasileiro Sebastián Cuattrin, que havia ficado em quarto lugar em sua prova de estreia na competição, em Cuba.

Quatro anos depois, no Pan de Mar Del Plata, na Argentina, país em que nasceu, Cuattrin subiu ao pódio duas vezes para receber dois bronzes, as primeiras das 11 medalhas que ele colecionaria em Jogos Pan-americanos ao longo da sua carreira, as primeiras da canoagem brasileira.

 

Rio Doce e proibido


Sebastián Ariel Cuatrin nasceu em Rosário, na Argentina, em 6 de setembro de 1973. Filho do professor universitário Alberto Oscar Cuattrin e da professora Sílvia, ele se mudou com os pais e os quatro irmãos, aos cinco anos de idade, para Governador Valadares, em Minas Gerais. A família se instalou na Ilha dos Araújos, um bairro grande. As crianças começaram a estudar numa escola localizada em frente ao Rio Doce. Um rio doce no nome, mas ameaçador, proibido e encantador.

“Eu saía da escola todos os dias, passava na frente do rio e, dois quarteirões depois, virava e entrava na minha casa. Meus pais sempre falaram para eu tomar cuidado, pois o rio tinha corrente, era perigoso e que aconteciam muitos afogamentos. Não queriam me ver perto do Rio”, conta Sebastián, em entrevista exclusiva ao Hall da Fama do COB.

Cuattrin obedecia aos pais sem questionar, até que um dia, ao sair da escola, viu um amigo da mesma classe subindo e descendo as corredeiras num caiaque.

“Eu achei aquilo tão fácil, ele fazia com tanta leveza, com tanta facilidade, que me pareceu uma brincadeira divertida. Eu larguei o meu material na beira do rio, o chamei e pedi para ele me ensinar. Ele me botou dentro do caiaque, me deu o colete salva-vidas e me colocou no meio da corredeira. Óbvio que eu capotei, né? Mas foi divertido. Subi no barco de volta e comecei a aprender a remar. Achei desafiador”, relata.

 

Às escondidas


Sebastián se encantou pelo passatempo, subir e descer o rio, se esconder atrás das pedras... Durante duas ou três semanas, essa foi uma aventura secreta.

“Eu fazia aquilo escondido dos meus pais. Falava que ia nadar na casa desse meu amigo e, na verdade, estava no rio, remando com ele. Até que o meu pai descobriu”, revela.

Cuattrin destaca que, em pouco tempo, já havia feito alguns amigos, que viram nele potencial.

“Eram pessoas mais velhas, empresários bem-sucedidos que já praticavam. Eles eram amigos do meu pai e o tranquilizaram dizendo que cuidariam de mim no rio. Eu virei a mascote do grupo”, lembra.

Na primeira fase da carreira, Sebastián treinava com essa turma duas vezes por dia: antes de ir para a escola e depois que saía da Prefeitura, onde trabalhava como contínuo.

 

Bom de esporte


Antes de conhecer a canoagem, aos 13 anos, Sebastián Cuattrin já havia praticado atletismo, vôlei, handebol, futebol de salão e xadrez, participando de algumas competições estaduais e interescolares com sucesso.

“Eu tive a sorte de ter excelentes professores de Educação Física na minha escola, o esporte sempre foi fonte de diversão. Eu me divertia muito, tinha prazer de competir”, divide.

Ansioso por mais tempo para treinar para os campeonatos de canoagem, Sebastián ousou pedir autorização à professora – Tia Margarida - para substituir as aulas de Educação Física pelos treinos no rio.

“Eu não sei o que aconteceu na cabeça dela, se Deus iluminou e disse para ela confiar em mim... Só sei que ela me autorizou. Aquilo foi fantástico, um impulso muito grande na minha carreira, porque eu tive a oportunidade de treinar mais horas. Entendi que quanto mais eu me dedicasse, melhores resultados eu conseguiria e mais longe eu iria, mas nunca imaginei que chegaria aos Jogos Olímpicos, jamais”, admite.

 

O primeiro caiaque


À medida em que se envolvia mais com a canoagem, novos desafios foram surgindo para Cuattrin. O primeiro deles foi comprar seu próprio caiaque, já que os treinos, no início da carreira, eram feitos com um emprestado.

“Eu guardava todo o meu salário, não precisava gastar com nada. Meu pai sempre falava que tudo que a gente ganhava com o nosso trabalho era para ir poupando, porque, lá frente poderíamos usufruir. Não pensei duas vezes quando apareceu a oportunidade. Um amigo estava vendendo um caiaque, ele foi lá em casa, meu pai liberou e tirou o dinheiro da minha poupança. Meu pai falou que não me daria de presente para que eu soubesse que minha conquista era fruto do meu trabalho. Uma das melhores recordações que eu tenho do meu pai é esse tipo de ensinamento”, emociona-se.

 

Rede de apoio


Depois de investir as economias no próprio barco, Sebastián precisava de recursos para participar das competições fora de Minas Gerais.

“Deus foi colocando pessoas no meu caminho, os meus anjos, que foram me ajudando, me fortalecendo e me direcionando dentro da carreira esportiva”, agradece Sebastián. “Os mesmos amigos do meu pai, que já haviam se juntado para cuidar de mim, decidiram patrocinar as minhas viagens e os meus campeonatos. Aos poucos, fui conquistando espaço e vieram outros apoiadores, outros patrocinadores. Nada muito grandioso em termos de números, mas o suficiente para eu conseguir fazer o que eu gostava, continuar trabalhando para ganhar meu dinheirinho e não gastar com aquilo que me dava prazer, que era a canoagem”, completa.

 

Vitória na primeira disputa


O primeiro título de Cuattrin veio logo na primeira competição, num campeonato em Varginha, no Rio das Mortes.

“Eu tinha um pouco de receio, já pelo nome do rio. Eu pensei: só tem um trecho difícil, se eu capotar nesse trecho, vou ter que desvirar o barco, tirar a água, montar de novo e tentar recuperar o tempo perdido. Larguei feito um maluco, uma prova longa, de 10, 12 quilômetros. Num trecho difícil, que era uma queda d’água grande, tipo um dique, uma represa, eu consegui passar bem, sem virar, e continuei abrindo no resto da parte do rio de água parada, na qual tinha mais intimidade. O resultado foi uma surpresa também para mim, porque eu não imaginava, na minha primeira competição, ganhar uma etapa do Campeonato Mineiro, onde existiam atletas de referência, que tinham muito mais nome, muito mais técnica”, detalha.

Cuattrin ressalta que não se deslumbrou com o resultado, pois sabia que havia competidores muito melhores e que ele tinha tido a sorte de não os enfrentar na primeira prova.

“Nesse mesmo ano, fui participar do Campeonato Brasileiro e descobri que tinham dois caras mais rápidos do que eu. Fiquei em segundo, mas também foi uma grande surpresa, uma grande conquista. No ano seguinte, ganhei deles dois, o Ezequiel Bicudo e Mário Bevilácqua, que são meus grandes amigos até hoje”, informa.

 

Referências


Quando começou a competir, Sebastián Cuattrin tinha como referências alguns esportistas de renome internacional, sendo Ayrton Senna a maior delas.

“Ele tinha muitas qualidades: garra, determinação, senso de justiça e brigava por isso, foco, não se abater com a derrota. Ele era uma referência do mais alto nível para o esporte brasileiro e eu era fã dele”, explica.

O jovem canoísta também se inspirava em Robert Scheidt, Lars Grael e Robson Caetano. “Outra pessoa que surpreendeu muito na minha vida como atleta e eu me inspirei foi o Robson Caetano. Nós nos conhecemos nos Jogos Pan-Americanos e ele sempre foi uma pessoa muito legal”, diz.

“Eu me sinto honrado em ser referência para o Sebastián e tantos outros jovens que surgiram, observando e dando passos na direção certa do sucesso. Eu tenho profunda admiração pelos determinados e o Sebastián é um deles”, declara Robson Caetano.

 

Em busca de evolução


Enquanto Sebastián se inspirava em outros campeões, seu talento também estava começando a ser observado. Em 1988, veio a primeira convocação para a Seleção Brasileira. Foi quando surgiu a oportunidade de sair de Governador Valadares para morar em São Paulo, na casa do técnico, e treinar na raia da USP (Universidade de São Paulo).

“Quando eu o vi competindo em dois eventos, em Brasília e Ipatinga, detectei um talento nato. São Paulo, na época, apresentava melhores condições de treinamento. Ele foi, desde sempre, um atleta muito aguerrido, disciplinado e focado. Tinha boa estatura, porém com uma estrutura muscular que deveria ser trabalhada. Além de ter uma ótima resistência física, apresentava uma força mental privilegiada. Sabia o que queria. Tinha, e tem, foco e disciplina. Sempre foi um atleta muito inteligente”, lembra o técnico Carlos Bezerra, considerado como um paizão por Sebastián.

Embora fosse ainda muito jovem, apenas 15 anos, Cuattrin teve todo o apoio dos pais para partir rumo ao seu sonho. A única condição era manter um bom desempenho também nos estudos. “Meu pai falou: 'Vai, a porta aqui está aberta. Se não der certo, você volta. Vai atrás do que você acha que é o seu sonho'”.

Carlos Bezerra faz questão de lembrar que tanto ele quanto os demais técnicos e a canoagem brasileira estavam em fase de aprendizagem nessa época.

“Eu tinha que conciliar o treinamento para o Sebastián com outros afazeres. Quando comecei, no início dos anos 80, aprendíamos as técnicas da remada vendo filmes, aqueles que conseguíamos. A maioria dos brasileiros não sabiam o que era a palavra canoagem. Vivíamos sem recursos financeiros. Muitos equipamentos e viagens foram custeados pelos próprios técnicos, dirigentes e atletas”, conta o técnico.

 

Desbravador


Em 1989, graças ao apoio dos empresários amigos de Governador Valadares, Sebastián Cuattrin tornou-se o primeiro brasileiro participar de um Campeonato Mundial de Canoagem. Dois anos depois, também foi o primeiro a disputar uma prova de canoagem nos Jogos Pan-americanos.

“O primeiro Pan foi um troço de louco. A Argentina era um time muito difícil de ser batido, há muitos anos. A gente sabia das dificuldades que íamos ter para tentar derrubá-los e ganhar uma medalha. E ainda tinha os canadenses, os norte-americanos e os cubanos. Estávamos conscientes de que seria uma tarefa difícil, mas também sabíamos que tínhamos treinado muito, nos preparado muito, e que estávamos muito bem fisicamente para isso”, avalia Sebastián, que ficou em quarto lugar.

 

“Sou brasileiro”


Argentino naturalizado brasileiro, ele diz nunca ter pensado muito na rivalidade entre os dois países.

“Os atletas argentinos brincavam muto com isso, me chamavam de fugido. Eu sempre considerei como uma brincadeira de bom gosto, nunca fiquei ofendido. Alguns treinadores diziam: pena que ele foi embora. Fugiu, poderia fazer parte do time aqui”, lembra Cuattrin que, diferentemente dos pais e de todos os irmãos, não optou pela dupla nacionalidade.

“Sem dúvida alguma, eu sou brasileiro”, afirma ele, mostrando o passaporte. “Eu agradeço ao país onde meus pais viveram, onde eles passaram a infância, a adolescência, me criaram, onde eu nasci, mas o país que me adotou foi o Brasil. Eu devo tudo o que eu sou ao Brasil!”, destaca.

 

Sonho olímpico


Cuattrin também entrou para a história como o primeiro atleta brasileiro da canoagem a disputar uma edição dos Jogos Olímpicos. Foi em Barcelona 1992.

“Quando eu comecei, nem sonhava com os Jogos Olímpicos, achava aquilo muito longe da minha realidade e estar lá foi uma mistura de emoções diferentes. A primeira delas foi de deslumbramento. Achei tudo lindo, maravilhoso. Pensava: 'Cara, estou aqui, pela primeira vez o Brasil presente. Que coisa louca, que emoção! É a primeira vez que o nosso esporte está aqui participando dos Jogos Olímpicos e eu sou um desses caras que vai inaugurar, romper a faixa'”, emociona-se.

Sebastián não participou da Cerimônia de Abertura, mas vibrou ao entrar no estádio e ouvir o público gritando “Brasil! Brasil!”, na Cerimônia de Encerramento.

“Quando eu fui para a raia, me vi do lado dos caras que eu assistia pela televisão, os ídolos do esporte, que todo mundo falava a respeito. Minha estratégia era ficar de olho no que eles faziam. Comecei a observar o aquecimento, qual era o tipo de remada, como funcionava. Eu discuti isso com o treinador, com a equipe. Foi quando entendemos que não poderíamos viver longe daquilo. A partir daí eu falei: isso aqui é muito legal! É sofrido chegar, mas é muito prazeroso estar. Vou treinar mais, quero voltar nesse lugar”, diz o canoísta que competiu no K1 500 e 1000 metros e na canoagem de velocidade, mas não conseguiu se classificar para a final.

 

Malas prontas para a Polônia


Um ano depois de disputar os Jogos Olímpicos, seguindo um conselho do técnico Carlos Bezerra, em 1994, Cuattrin foi para a Europa, onde começou a treinar com o técnico polonês Zdzilaw Szubski.

“No Mundial de 89, eu havia conhecido um cara que fez a canoagem de Portugal crescer de uma maneira gigantesca. Era um polonês que falava português e me ajudou muito naquele Mundial e fiquei muito grato. Consegui suporte dos meus patrocinadores, os meus pais me ajudaram e eu fui para a Polônia, passar uma temporada. Fiquei com ele seis, sete meses, treinando na Europa”, lembra Cuattrin.

Szubski conta que o brasileiro chegou de chinelo e bermuda, carregando uma malinha pequena, em pleno inverno polonês, dizendo que queria treinar. O técnico compartilha que os testes realizados mostraram que Cuattrin necessitaria de um trabalho físico sério para ganhar força muscular.

“Eu ensinei a ele que o tempo de trabalho é muito importante, que treinamento sistemático é muito importante, mas que descansar também era fundamental. Ele não sabia descansar. Com calma, ele começou a acreditar em mim e a alcançar melhores resultados”, relata Zdzilaw Szubski.

“Ele fala até hoje: 'Nunca acreditei que você ia chegar aonde você chegou. Quando você chegou na minha casa, você era um frango'. E realmente eu era bem magrinho”, diverte-se Cuattrin.

Pouco tempo depois, o presidente da Confederação Brasileira de Canoagem, João Tomasini Schwertner, convidou o treinador polonês para treinar a Seleção Brasileira.

“Ele voltou comigo para o Brasil. Começou um trabalho de formiguinha na USP, que nos ofereceu alojamento, alimentação, a raia e abriu as portas para que a gente pudesse treinar lá. Aos poucos, fomos crescendo, com esforço e dedicação”, explica Cuattrin.

 

Medalhas nos Jogos Pan-americanos


Já com o novo técnico, Sebastián Cuattrin disputou os Jogos Pan-americanos Mar Del Plata 1995 e conquistou as primeiras medalhas da canoagem brasileira na competição: foi bronze no K1 1000m e no K2 1000m, ao lado de Álvaro Koslowski.

“Tive grande confiança para esse Pan. Conhecia um pouco os outros países, não ignorei ninguém, mas sabia que com o trabalho e a dedicação deles, principalmente do Sebastián, era possível ganhar medalha. Coloquei na cabeça deles que havíamos ido lá para ganhar medalhas e que não era para sair sem subir no pódio. Foram as primeiras medalhas na história da canoagem brasileira, acho que nunca vão esquecer. Foi uma maravilha, mas não uma surpresa. Nós trabalhamos e ganhamos”, avalia Szubski.

“Eu me lembro de quando ganhei a primeira medalha. Foi um negócio maravilhoso subir naquele pódio. Foi fantástico! Eu já treinava com o Szubski, mas aquela conquista também foi fruto do trabalho do Bezerra, que me construíra até aquele momento. O novo técnico veio para continuar me construindo”, reconhece Sebastián.

 

Uma vaga por um bigode


Em 1º maio de 1996, a seleção brasileira de canoagem participou das provas classificatórias para os Jogos Olímpicos de Atlanta. Na disputa do K2 500 metros, Sebastián e Álvaro Koslowski não conquistaram a vaga por um centésimo de segundo. Sebastián carimbou seu passaporte para participar do K1 1000m nos Jogos Olímpicos.

“A luta foi forte”, diz Szubski.

Apesar da tristeza pela desclassificação de Koslowski, Sebastián conta que se divertiu muito ao ganhar uma aposta com o técnico polonês. Acostumados a apostar, Szubski prometeu raspar o bigodão de estimação que cultivava com o máximo cuidado, há 15 anos, caso o brasileiro conseguisse se classificar para Atlanta 1996. Cuattrin, se perdesse a aposta, teria de raspar todos os pelos do corpo, incluindo as sobrancelhas.

“Quando nós voltamos para casa, eu não falei nada porque estava um clima um pouco triste, já que o meu parceiro não iria para os Jogos. O clima não estava festivo. Aí, eu escuto um barulho e, de repente, ele entra na sala sem o bigode. A gente teve um ataque de riso. Ele começou a olhar no espelho e disse: ainda bem que eu perdi essa aposta. Como eu consegui usar aquele bigode? Ele nunca mais usou bigode. Bigode para polonês é uma tradição. Ele rejuvenesceu uns 20 anos. Agora sim estou bonito, ele dizia. Ele lembra até hoje e diz que não tem saudade nenhuma do bigode”, diverte-se Cuattrin.

 

Final olímpica histórica


Em sua segunda participação em Jogos Olímpicos, Sebastián Cuattrin entrou, novamente, para a história. Dessa vez como o primeiro brasileiro a se classificar para uma final olímpica na canoagem.

“Eu nunca esqueço quem estava lá na prova classificatória para a final: foi o americano, o alemão, o argentino, o português e ele. O argentino não se classificou, o americano não se classificou. Pode imaginar isso? Sebastián se classificou. Quando ele chegou à plataforma e saiu do barco, eu dei um mergulho para abraçá-lo. Nossa que emoção, eu me emociono até hoje, toda vez que me lembro disso”, revela Szubski.

“Foi uma prova muito disputada, onde eu consegui vencer um dos meus grandes amigos e o meu arquirrival na América, o argentino Abelardo Sztrum, que tinha ganhado de mim desde o Pan de 91 até aquela data, em 96. Eu fiquei com a quinta vaga, a nona vaga da final foi minha e ele ficou fora. Se não me engano, foi a primeira vez que um atleta sul-americano entrou numa final em Jogos Olímpicos. Depois vieram outros que fizeram resultados melhores, mas aquele foi o primeiro impulso. Foi fantástico!”, vibra Cuattrin, que na final ficou em oitavo lugar.

“Ele conseguiu esse feito graças à sua dedicação, mas também ao apoio da Confederação Brasileira, do presidente João Tomasini, e do Comitê Olímpico do Brasil. Sozinho ele não poderia fazer isso”, observa o técnico polonês.

 

Pioneiro


Sob o comando do técnico polonês, com quem treinou por 12 anos, em 1998, Cuattrin tornou-se o primeiro brasileiro a conquistar uma medalha numa etapa da Copa do Mundo de Canoagem.

“Ser o primeiro sempre foi muito desafiador, mas também era diversão. O que eu conseguisse fazer ia ser legal, porque eu era o primeiro a fazer. Eu não tinha pressão de ganhar medalha. Eu sempre pensava assim: eu vim aqui, treinei duro, fiz o meu melhor, me dediquei, recebi apoio, tenho suporte dos patrocinadores, eu preciso fazer o que eu sei fazer, sem pressão.”

“É sempre muito difícil ser o precursor de qualquer coisa que você faça na vida e o Sebastián foi o precursor da canoagem, né? Quem mostrou para todos nós que era possível. Então, o caminho dele foi duas, três vezes mais difícil do que o nosso, que já é difícil. A importância dele é inexplicável, não tem nem como mensurar todo o caminho que ele abriu para os canoístas do Brasil”, ressalta Pedro Henrique Gonçalves da Silva, o Pepê, que disputou os Jogos Olímpicos do Rio 2016 e Tóquio 2020, e começou a competir por influência direta de Cuattrin.

Pepê vivia em Piraju, onde a seleção brasileira treinava, e conta que via Sebastián passando nas ruas, treinando, dando entrevistas e sonhava ser igual aquele que cara que morava na cidade.

“Indiretamente, foi o meu primeiro ídolo do esporte, porque era o ídolo mais perto que eu tinha e era da modalidade que eu escolhi para a minha vida”, revela.

 

Sydney e Atlanta


Oitavo colocado em Atlanta 1996, Cuattrin sonhava com uma medalha em Sydney 2000, mas as coisas não aconteceram exatamente como planejado.

“A gente voltou para casa com muito mais respeito, com muito mais suporte. Tivemos todo o suporte do Comitê Olímpico do Brasil, que sempre ajudou a canoagem, sempre abriu as portas, sempre confiou que era um esporte que tinha que ajudar para poder crescer e que tinha possibilidade de trazer bons resultados. O COB, numa parceria com a Confederação, sempre foi construindo coisas melhores”, elogia o canoísta. “Foi uma explosão de emoções. Você fala: cheguei à final, por que não? É possível. Quatro anos atrás eu era o 28º, hoje eu sou o 8º, por que não daqui a quatro anos ser terceiro ou quem sabe melhor?”, dizia.

A equipe tinha boas chances de ir para os Jogos de Atenas, mas houve um racha. Alguns atletas continuaram com o técnico polonês, outros optaram por seguir outro caminho.

“Os que seguiram com o Szubski se classificaram para os Jogos Olímpicos e os que não seguiram não conseguiram. A seleção rachou, ficou um clima meio ruim e a gente não conseguiu atingir os objetivos que tinha planejado em 96 e chegar a uma medalha. Se não houvesse esse racha, a seleção teria vivido momentos melhores. Não dá para dizer que iria ganhar medalha, mas toda a seleção teria vivido momentos melhores, inclusive todos os outros que não foram aos Jogos”, supõe Sebastián, que competiu no K2 500m e no K2 1000m, ao lado de Carlos Augusto Pimenta Campos, o Guto, sem se classificar para as finais.

“O José Campos é um atleta muito forte. Pensamos que dava para fazer melhores resultados no K2 do que no K1, porque o nível do K1 estava muito alto. Mas faltou mais tempo de treinos juntos. A experiência foi boa, achamos que dava para pensar em medalha, mas não deu”, avalia Szubski.

Em Atenas 2004, ele participou das disputas do K1 500m, do K1 1000m e do K2 500m, em dupla com Sebastian Szubski, filho do técnico Zdzilaw Szubski, sem avançar para as finais.

“Seba foi a pessoa mais importante entre todos os que iniciaram e influenciaram a canoagem brasileira. Gosto de compará-lo ao Ayrton Senna. Cada vitória dele foi conquistada com o coração. Nós, os mais jovens, tentamos seguir o exemplo dele”, elogia Sebastian Zdzilaw.

 

Colecionando medalhas


Em 22 anos de carreira, Cuattrin colecionou medalhas. Foram nove em Copas do Mundo, 25 em Campeonatos Sul-americanos e 11 em Jogos Pan-americanos. A “coleção” no Pan começou com os dois bronzes em Mar Del Plata, em 1995. Depois, quatro no Pan de Winnipeg, no Canadá, em 1999 ( bronze no K2 500m, prata no K2 1000m, ambas com Carlos Augusto Campos, prata no K1 1000m e bronze no K4 1000m, com Carlos Augusto Campos, André Lúcio Caye e Raor Carmo). Nos Jogos Pan-americanos de Santo Domingo, em 2003, na República Dominicana, foram mais três medalhas de prata no K1 500m, no K1 1000m e no K4, com Sebastian Szubski, Carlos Augusto Campos e André Caye. Com sete medalhas de prata e três de bronze, o objetivo maior de Sebastián passou a ser a conquista da medalha de ouro.

“Na República Dominicana, eu vinha na frente, os cubanos passaram e a gente perdeu a tão sonhada medalha de ouro. Fiquei com a prata de novo”, diz.

 

O ouro aos 47 do segundo tempo


Em 2005, Cuattrin passou a ser treinado pelo técnico polonês Ákos Angyal, que tinha um estilo completamente diferente do outro polonês. Os Jogos Pan-americanos 2007 aconteceram no Rio de Janeiro. Com a família e amigos presentes e a atmosfera especial de competir em casa, Sebastián foi para a disputa do K1 1000m cheio de confiança.

“Fiz o melhor tempo na eliminatória, o melhor tempo na semifinal, entrei na final muito confiante: vai ser agora! O canadense me fez uma surpresa, uma série de contra-ataques, ele me passou, eu passei, até que eu não consegui resistir. Ele ganhou a prova e eu fiquei com a prata de novo”, lamenta.

Cuattrin conta que depois de receber a medalha e chorar, tinha a missão disputar mais uma prova, o K4, 40 minutos depois. “Meu técnico falou: ‘Não é o seu sonho? Você vai conquistar o seu sonho! Tem mais uma chance, não acabou’”, lembra.

“Sebastián é um atleta super determinado. Como em 2005 e em 2006 conseguimos conquistar várias medalhas de ouro nos Campeonatos Pan-americanos da modalidade, tínhamos a expectativa para ganhar ouro no Jogos Pan-americanos. Os atletas estavam bem entusiasmados e treinavam com muita vontade. Sebastian sempre esteve à frente e puxou a galera, ele sempre foi um bom exemplo para os outros. Foi fácil trabalhar com ele”, declara o técnico Ákos Angyal.

Sebastián conta que a equipe toda veio até ele para animá-lo.

“A fisioterapeuta, que, por acaso, era a minha esposa, soltou a minha musculatura e falou: ‘você está preparado para a próxima prova, agora é contigo! Ela agiu de maneira muito profissional, soube separar as coisas, como sempre. Eu comecei a me concentrar e vieram os meus companheiros de barco, me abraçaram e disseram: a gente vai ganhar essa medalha, cara! Eu entrei na água muito confiante. E a gente ganhou. (Pausa para a emoção)", relembra.

"É uma lição porque eu acabei ganhando a medalha num barco de equipe. Eu nunca fui um cara muito de barco de equipe, sempre fui especialista em barco individual. Foi minha última prova em Jogos Pan-Americanos. Foi aos 47 do segundo tempo, ou na cobrança de pênaltis’. Aí eu entendi o que Deus tinha feito. Primeiro, ele tinha me proporcionado um momento muito mais especial do que quatro anos antes, porque eu estava em casa, estava com a minha família, com os meus amigos... Foi um momento superespecial, maravilhoso! Até aquele dia, até aquele momento, eu não tinha compreendido o porquê de não ter ganhado o ouro em Santo Domingo, quatro anos antes. Eu entendi que Deus tinha reservado uma coisa muito melhor. Foi uma festa muito mais completa e o encerramento de uma carreira com chave de ouro”, acrescenta.

 

Novos rumos


Depois do Pan do Rio, Sebastián Cuattrin competiu mais uma vez no Campeonato Brasileiro daquele ano, tentou a classificação para os Jogos de Pequim, não conseguiu e encerrou a carreira. Recebeu uma homenagem tão especial da CBCa que ainda o emociona só ao lembrar. Ironicamente, a esposa Regina, que nunca esteve ao lado dele nas quatro edições de Jogos Olímpicos que disputou, foi chamada pelo COB para ir a Pequim como fisioterapeuta.

“Eu diria que a minha família tem um histórico de Jogos Olímpicos. Desde 92, a gente está presente em todos os Jogos Olímpicos e em todos os Jogos Pan-americanos”, orgulha-se.

Sebastián agradece às pessoas que o ajudaram na sua trajetória: ao COB, aos treinadores, ao ex-presidente da CBCa João Tomasini Schwertner - falecido em janeiro de 2021, vítima de COVID-19 - e, em especial à esposa, Regina.

“Minha placa de homenagem no Hall da Fama talvez tivesse que ter uma mão minha e uma mão da Regina, porque ela dedicou a vida a me acompanhar. Abriu mão da carreira profissional de sucesso que ela tinha. Nos mudamos algumas vezes e ela tinha que começar tudo de novo”, ressalta.

 

Vibrando com a nova geração


Pouquíssimo tempo depois da aposentadoria como atleta, João Tomasini convidou Cuattrin para ser o treinador das equipes cadete e júnior da seleção brasileira. Formado em Educação Física, com especialização em treinamento de alto rendimento e em Gestão Esportiva de Alto Rendimento pelo Instituto Olímpico do Brasil (IOB), braço de educação do COB, Sebastián é, segundo ele, um dos poucos treinadores brasileiros que têm o nível mais alto de treinamento de canoagem, que é a Faculdade na Hungria.

Nos Jogos Olímpicos Rio 2016, além de ter tido a honra de conduzir a tocha, ele atuou como gerente geral da canoagem e teve a alegria de acompanhar de perto as medalhas de Isaquias Queiroz e Erlon Souza, prata no C2 1000m, e Isaquias, prata no C1 1000m e bronze no C1 200m.

“Isaquias fez barba, cabelo e bigode, três medalhas no Rio. Eu vi toda a história desses meninos, eu acompanhei cada remada deles. É uma sensação maravilhosa ter visto o crescimento deles, vê-los chegar aonde chegaram e ainda poder ter construído os Jogos onde eles ganharam medalhas, as primeiras medalhas olímpicas da canoagem brasileira”, vibra Cuattrin.

Atualmente, o desbravador da canoagem brasileira mora na Suíça e trabalha na Federação Internacional de Canoagem, ajudando países em desenvolvimento a crescer.

“Eu passei por todas as fases dentro da canoagem brasileira. Fui atleta, fui treinador das categorias de base, fui administrador, passei a fazer Jogos Olímpicos e acho que, durante todo esse processo, contribui para o desenvolvimento da canoagem. Acho que plantei uma sementinha, que alguém está regando, que alguém está cuidando, que está adubando. Essa árvore já cresceu e não é fruto meu, é fruto do trabalho de uma grande quantidade de pessoas que se dedicou também, não só na minha época, mas que continua se dedicando para que essa árvore chamada canoagem continue dando frutos”, analisa.

 

Cereja do bolo


Para Sebastián Cuattrin, estar no Hall da Fama do COB é a cereja do bolo da sua carreira.

“Eu jamais esperei, foi uma surpresa enorme, uma honra muito grande ter entrado para o Hall da Fama, sabendo que ali muitos têm medalha olímpica. Eu não tenho medalha olímpica. Consegui uma final só, mas eu fico muito contente por esse reconhecimento do COB, por entender que o resultado que eu atingi, naquela época, com as condições que eu tinha, era tão importante quanto uma medalha. Aquele resultado para mim foi uma grande medalha e o COB reconhecer isso é fantástico! Fico muito feliz de ser homenageado por uma casa pela qual eu tenho um carinho tão grande”, festeja.

“Acho que ele ter entrado para o Hall da Fama do Comitê Olímpico do Brasil é um reconhecimento enorme e me mostra que eu escolhi certo o meu ídolo e mentor. Mais do que merecido pelo trabalho que ele fez, quando era três, quatro vezes mais difícil do que é hoje”, finaliza Pepê.

Sebastián Ariel Cuattrin
Vídeo

Sebastian Cuattrin é homenageado no Hall da Fama do COB em 2021

Com onze medalhas em Jogos Pan-americanos (um ouro, seis pratas e quatro bronzes) e quatro participações em Jogos Olímpicos, Sebastián Cuattrian foi o primeiro finalista olímpico da canoagem brasileira e alcançou o 8° lugar em Atlanta 1996. Um marco para o esporte olímpico.
 

Vídeo

Hall da Fama do COB - Homenagens no Prêmio Brasil Olímpico 2021

Paula (basquete), Sebastián Cuattrin (canoagem de velocidade), Adhemar Ferreira da Silva (atletismo) e Tetsuo Okamoto (natação) foram homenageados no Hall da Fama do COB durante o Prêmio Brasil Olímpico em 2021. Adhemar e Tetsuo, atletas já falecidos, foram representados por familiares e receberam placas comemorativas enaltecendo a importância de seus feitos para o esporte nacional. 

HomenageadoHomenageado

GALERIA DE FOTOS

RESULTADO EM DESTAQUE

ediçãoresultadoprova
Jogos Pan-Americanos Winnipeg 1999
3º LugarBronze
K-4 1.000 - Masculino
Jogos Pan-Americanos Winnipeg 1999
3º LugarBronze
K-2 500 - Masculino
Jogos Pan-Americanos Winnipeg 1999
2º LugarPrata
K-1 1.000 - Masculino
Jogos Pan-Americanos Winnipeg 1999
2º LugarPrata
K-2 1.000 - Masculino
Jogos Pan-Americanos Santo Domingo 2003
2º LugarPrata
K-1 1.000 - Masculino
Jogos Pan-Americanos Santo Domingo 2003
2º LugarPrata
K-1 500 - Masculino
Jogos Pan-Americanos Santo Domingo 2003
2º LugarPrata
K-4 1.000 - Masculino
Jogos Pan-Americanos Rio 2007
1º LugarOuro
K-4 1.000 - Masculino
Jogos Pan-Americanos Rio 2007
2º LugarPrata
K-1 1.000 - Masculino
Jogos Pan-americanos Mar del Plata 1995
3º LugarBronze
K-1 1.000 - Masculino
Jogos Pan-americanos Mar del Plata 1995
3º LugarBronze
K-2 1.000 - Masculino

ACERVO

)