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Edinanci Silva

Edinanci Silva

modalidade

Judô

data e local de nascimento

23/08/1976

BIOGRAFIA

As lutas começaram bem antes de subir ao tatame. Edinanci Silva desafiou os limites de uma infância difícil no interior da Paraíba para quebrar barreiras e se tornar um dos grandes nomes da história do judô brasileiro. Primeira mulher do país a disputar quatro Jogos Olímpicos, fincou seus passos entre os maiores ao vencer preconceitos e se impor diante da ignorância. Em 2025, entra para o Hall da Fama do Comitê Olímpico do Brasil com uma trajetória de vitórias dentro e fora do esporte.

 

O início não foi simples. Nasceu em Sousa, no interior da Paraíba, em 1976. Aos 11 anos, deixou o alto sertão com a família em busca de um futuro melhor em Campina Grande, uma das maiores cidades do estado. Ainda assim, nada era muito fácil. Edinanci pouco frequentara a escola até ali - não por vontade própria, mas por questões sociais e econômicas na qual vivia. “Até os 11 anos, só tive a oportunidade de estudar por oito meses no total. Escola, área de lazer, local para praticar esporte, isso aí era tudo fantasia. Na minha periferia não tinha água, alimento, não tinha nem a saída do crime. É diferente das grandes cidades, só quem viveu sabe.”, disse em depoimento ao UOL

 

Mas, aos 15 anos, uma labirintite a levou ao esporte por recomendação médica. Queria o karatê, incentivada pelos filmes que via na televisão. A vaga em um clube onde a mãe era sócia, porém, surgiu no judô. “Logo meu professor começou a me colocar em competições e eu passei a ter algo que não tinha: perspectivas de vida.”, disse à mesma reportagem. Era o início de uma longa e vitoriosa caminhada na modalidade.

 

Mulher, negra e nordestina, Edinanci logo se desenvolveu no esporte, disputou competições e se impôs como uma das maiores revelações do judô brasileiro na categoria meio-pesado (-78kg). Aos 17 anos, deixou a Paraíba rumo a Guarulhos, em São Paulo, para disputar os campeonatos nacionais. Passou a dominar o cenário juvenil e recebeu proposta de São Caetano do Sul para mudar de cidade. Lá, construiu boa parte da carreira e o caminho até a seleção logo se abriu. 

 

Exemplo de resiliência dentro e fora dos tatames

 

A trajetória de Edinanci Silva transcende os tatames. Em 1995, rumo aos Jogos Olímpicos de Atlanta, a atleta precisou lutar contra a ignorância as descobrir, em um teste de feminilidade obrigatório à época, e se descobriu uma pessoa intersexo  (com características biológicas tanto masculinas quanto femininas). Por isso, para poder competir e até para evitar possíveis problemas de saúde no futuro, precisou passar por uma cirurgia para a retirada de dois testículos internos, que produziam uma alta quantidade de hormônios masculinos. E, num ato de coragem e resiliência, anos depois, Edinanci rompeu silêncios e falou sobre o assunto dentro do ambiente esportivo, até então bastante conservador. 

 

Edinanci colocou o tema intersexualidade em pauta, abrindo espaço para outras vozes e para o amadurecimento do debate sobre diversidade no esporte.

 

"Entre 1995 e 1996, minha vida foi o cão. Não podia sair na rua porque ficavam me atacando. Não fisicamente, mas com palavras. Em Guarulhos, quando as pessoas me reconheciam, diziam: 'Isso aí é um homem', usavam palavras chulas para me atacar", segundo a atleta, o questionamento da imprensa transformou sua vida em um episódio do programa "Você Decide" - disse a judoca em uma entrevista para o UOL em julho de 2024.

 

Os ataques mexeram com o psicológico de Edinanci, que chegou a pensar em desistir do esporte por conta das ofensas. "Pensei em suicídio mesmo. O hater pelas redes sociais machuca essa geração. Mas o hater pessoal é mais duro. Machuca, você não tem ideia", disse na mesma reportagem citada.

 

Depois de defender a equipe de Guarulhos em 1995, voltou a São Caetano do Sul. "A partir dali, defendi a equipe de São Caetano do Sul nos Jogos Abertos por quase 25 anos. Me aposentei da seleção em 2008, mas em 2019 eu ainda estava ganhando medalha de ouro pela cidade que tentou me barrar", conta ainda na mesma entrevista.

 

Edinanci Silva se tornou um exemplo de mulher forte, uma verdadeira inspiração para uma geração de judocas como Sarah Menezes, Érika Miranda, Rafaela Silva, Ketleyn Quadros, Maria Portela, Mayra Aguiar, Maria Suelen Altheman, dentre outras, que conquistou todos os títulos possíveis para o judô feminino brasileiro nos anos seguintes. 

 

Carreira vitoriosa

Edinanci fez história na modalidade, sendo uma das maiores judocas do país. No esporte, mesmo sob diversos ataques da sociedade, ela trabalhou duro e fincou seu nome como um dos maiores da história do esporte olímpico do Brasil. Ao todo, a atleta disputou quatro Jogos Olímpicos, sendo a melhor colocação o 5º lugar em Pequim 2008, sua despedida. Em Atlanta 1996, Sydney 2000 e Atenas 2004 conquistou o honroso 7º lugar.

 

As maiores conquistas da carreira foram as medalhas de bronze nos Campeonatos Mundiais de Judô de Paris, em 1997, e de Osaka, em 2003, as maiores conquistas do judô feminino brasileiro até então, ao lado do mesmo pódio de Danielle Zangrando (também bronze no Mundial de Tóquio, em 1995). Edi também foi campeã do prestigioso Grand Slam de Paris, um dos torneios mais tradicionais do judô mundial.

 

Esses resultados foram históricos tanto para sua carreira quanto para o judô feminino brasileiro, além de ajudarem a consolidar o Brasil como uma potência emergente na modalidade. Por muitos anos, ela foi a única brasileira com mais de uma medalha em mundiais adultos entre as mulheres, mostrando o seu pioneirismo e consistência na modalidade. 

 

Em Jogos Pan-americanos, mais uma amostra da grande atleta que foi Edinanci. Com os dois ouros, um na edição de Santo Domingo 2003 e outro na Rio 2007, se tornou a primeira judoca a ser bicampeã dos Jogos. Ela também tem um bronze, em Winnipeg 1999. Edinanci se aposentou da seleção em 2009. Ainda assim, seguiu defendendo São Caetano nas disputas dos Jogos do Interior até 2019, quando resolveu se aposentar. Hoje, a ex-atleta dá aulas em dois projetos sociais na região do Grande ABC.

 

Legado olímpico

 

A ex-atleta foi uma das figuras recrutadas pela comissão técnica da seleção brasileira paralímpica para ajudar nos treinos preparatórios dos judocas para Tóquio 2020, em que o Brasil conquistou um ouro e dois bronzes, apenas com mulheres. "Adoro treinar e, sem a responsabilidade da antiga rotina de competição, fica bem mais solto para mim. Acabo ficando com o espírito mais leve também para passar energia positiva a eles. Então, é uma troca", contou ao site Surto Olímpico em 2020.

 

Além de servir de exemplo para as gerações futuras do judô feminino brasileiro, Edinanci recebeu algumas homenagens pela sua trajetória profissional. Em 2021, foi homenageada pela CBJ com a graduação de 6º Dan, tornando-se Kodansha (faixa coral), e, em 2023, foi condecorada com a Ordem do Mérito, maior honraria do judô brasileiro.

 

Em 2024, aos 48 anos, tornou-se a quinta atleta do judô a ingressar no Hall da Fama do COB, a primeira mulher, unindo-se a Chiaki Ishii, Aurélio Miguel, Rogério Sampaio e Walter Carmona.

 

Edinanci Silva

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