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Sandra Pires

MODALIDADE

Vôlei de praia

DATA E LOCAL DE NASCIMENTO

16/06/1973 | Rio de Janeiro, RJ

JOGOS OLÍMPICOS

1996 | 2000 | 2004 |

CONQUISTAS

3

Medalhas de Ouro

Jogos Olímpicos Atlanta 1996 Circuito Mundial de Vôlei de Praia temporada 1996 1996 Grand Slam de Vôlei de Praia Berlim 2003

1

Medalhas de Prata

Campeonato Mundial de Vôlei de Praia Rio de Janeiro 2003

1

Medalhas de Bronze

Jogos Olímpicos Sydney 2000

Biografia

Telefonema de ouro muda a vida da menina da Ilha do Governador

O verão de 1994 já havia começado quando o telefone tocou em um apartamento no terceiro andar do Condomínio Rubem Berta, na Ilha do Governador, Rio de Janeiro. Naquela época só existia telefone fixo. Poderia ser uma ligação como qualquer outra. Não era. Dona Norma não reconheceu a voz do outro lado da linha, tampouco sabia quem era a tal Jacqueline que pedia para conversar com sua filha. Assim, dona Norma fez a única coisa que poderia fazer. 

“Sandra, tem uma Jacqueline aqui que está querendo falar com você”, ela disse, ao chamar pela filha.

Sandra também não entendeu. Ela não conhecia nenhuma Jacqueline, mas foi lá descobrir do que se tratava. Nem Sandra ou qualquer outra pessoa na família podia imaginar é que aquele telefonema mudaria completamente o rumo de sua vida. E a faria se encontrar com seu destino de uma maneira bastante inusitada.

No início, o atletismo

Sandra Pires nasceu em 16 de junho de 1973. Filha de dona Norma com o seu Arnaldo, era a caçula do casal e havia vindo ao mundo sete anos depois do irmão, Alex. Criada na Ilha do Governador, bairro de classe média do Rio de Janeiro, Sandra, quando pequena, gostava de saltar e de correr. Desta forma, quando lhe contaram que havia um esporte no qual ela poderia fazer as duas coisas, se interessou rapidamente.

“Meu primeiro esporte foi o atletismo, no ensino primário. Eu estudava numa escola pública, na Ilha do Governador, e eles não tinham muito o que oferecer, porque a única quadra, onde eram realizados todos os eventos da escola, como Dia dos Pais e Dia das Mães, não era coberta. A escola existe até hoje, chama-se Maestro Francisco Braga”, conta Sandra.

“Deve ter sido com uns 10 anos que eu comecei no atletismo. Era salto em distância na caixa de areia, salto em altura no colchão, e a gente também fazia corrida. Eu gostava muito de provas curtas. Eu lembro que não gostava muito de corrida longa. Me dava aquela dor aqui no lado. Era horrível aquilo. Eu acho que não sabia respirar direito. Então essa corrida mais de tiro, de explosão pura, era melhor para mim. Eu gostava muito e acho que foi ali que eu comecei a descobrir esse gosto por competir, fazendo atletismo numa escola municipal. Era um atletismo bem lúdico, aquela coisa bem de criança mesmo, mas já tinha o lado da competição que a gente acaba despertando, independentemente da idade. Era uma coisa sem muito compromisso, mas eu gostava de participar”, prossegue.

Apesar da paixão pelos saltos e pelas corridas de curta distância, o atletismo em breve ficaria para trás. Em pouco tempo, Sandra descobriria sua verdadeira vocação esportiva.

“Quando entrei no ensino médio, com 11 anos, fui para uma outra escola, o Colégio Cenecista Capitão Lemos Cunha, também na Ilha do Governador. Essa escola contava com uma estrutura muito legal. Tinha uma ótima quadra poliesportiva, horta, banda, teatro... E aí eu fui experimentar o vôlei. E me apaixonei”, lembra.

Incentivada pelo professor de Educação Física Serginho, Sandra mergulhou no mundo do vôlei e aquela nova modalidade a encantou profundamente.

“Ele me deu muita força. Tinha uma escolinha também. Eu fazia educação física e brincava de cinco corta no recreio. Depois, entrei para a escolinha do Serginho, que era ótimo professor, três vezes por semana. Foi ali que eu despertei para o vôlei. Como já praticara um pouco de atletismo, aquilo me ajudou porque eu tinha mais força e equilíbrio do que as meninas da minha idade, além de uma noção corporal melhor”, ressalta.

O vôlei e os meninos

Ter entrado na escolinha de vôlei foi uma decisão que significou a primeira guinada na vida da jovem Sandra. A partir dali o esporte passou a fazer parte de sua rotina de forma significante e essa decisão foi o alicerce que iria definir o destino daquela carioca que estava predestinada a se tornar uma campeã olímpica.

“Eu continuei treinando nessa escola e comecei a competir em clubes. Eu já treinava em alguns clubes lá na Ilha do Governador mesmo, era bem fominha de bola. Jogava todo fim de semana em todo lugar que podia. Onde eu morava é um lugar bem aberto. Tinha várias praças. Amarrava a rede numa árvore e num prédio e gostava de jogar muito ali. Era uma terrinha, não era areia. Jogava também no cimento, num outro lugar lá perto, onde tinha um complexo com algumas quadras. Eu ficava realmente pentelhando os homens para jogar. Eu pentelhava mesmo”, diz aos risos e divertindo-se com as lembranças.

Ter sido aceita pelos meninos foi outro ponto determinante na evolução esportiva de Sandra.

“Não tinha tanta mulher praticando, então acabei jogando mais com eles. E aquilo me ajudou a jogar melhor, porque você tem que fazer mais força para jogar com os homens. Tem que saltar mais. Por causa disso eu estimulei mais tudo, minha técnica e meu físico. E eles me aturavam. Eles já jogavam muito. Hoje em dia eles ficam super orgulhosos daquela pentelha que ficava atrapalhando o jogo. Olha o que ela é: uma campeã olímpica”.

Supergrasbrás e Rio Forte

A dedicação aos treinos e a insistência em jogar com os meninos logo renderiam frutos. Aos 14 anos, Sandra foi convidada pela primeira vez a jogar na categoria de base de uma equipe de ponta. Apesar de a experiência não ter sido longa, foi um episódio que a preparou para o que ela viveria um pouco mais adiante.

“Na escola, onde eu continuei jogando, o Serginho me botava para fazer coletivo com os meninos. Quando ia jogar torneios fora da Ilha, eu sempre me destacava. Tanto que a Supergasbrás, que era um time excelente na época, me convidou para fazer um teste quando eu tinha 14 anos. Fiquei uma semana lá. Por ser longe de casa, minha mãe ia comigo. Eu estava em um time forte, com meninas da minha idade. Treinei só uma semana, mas fiquei muito acanhada, com vergonha. As meninas já se conheciam e muitas tinham jogado juntas em outros clubes”, recorda Sandra, que enumera outros motivos para ter desistido.

“Eu estudava e seria muito difícil morar na Ilha do Governador e treinar em dois períodos. Não me via parando de estudar. Acho que estava na 8ª série e acabou que eu não voltei mais para a Supergasbrás.  O Flamengo, que também tinha um bom time, foi outro clube que me convidou, mas não fui. Continuei jogando em clubes na Ilha do Governador. Nunca deixei de jogar, mas jogava em times que não tinham a mesma estrutura dos da zona sul”, destaca.

Foi somente depois de alguns anos que Sandra Pires, após ter concluído o ensino médio, resolveu que era hora de apostar todas suas fichas no vôlei. Àquela altura, ela não tinha como imaginar, mas essa seria a decisão que a encaminharia para o vôlei de praia e que a levaria, pouco depois, aos Jogos Olímpicos Atlanta 1996, onde ela entraria definitivamente para a história do esporte brasileiro.

“Quando eu terminei o ensino médio, me convidaram para jogar no time da Rio Forte. Era hora de experimentar de verdade. Falei com meus pais e pensei: agora, ou entro para a faculdade ou tento o vôlei. Naquela época não tinha ensino online, então não dava para conciliar as duas coisas de jeito nenhum, ainda mais morando na Ilha do Governador e treinando na Urca. A Rio Forte treinava dentro do Forte da Urca. Eu tinha que pegar duas conduções para ir e duas para voltar e ainda fazer baldeação. Com dois treinos por dia, não tinha como fazer as duas coisas”, explica.

Ainda tentando se encontrar em quadra, Sandra, que à época tinha 1,75m, atuou em várias posições. 

“Joguei de meio e na entrada de rede no time juvenil. Eu era uma jogadora baixa, porém muito rápida. Eles estavam me testando e definindo qual posição eu jogaria. Eu jogava na entrada, na saída, e muitas vezes de meio. Foi ali que o lado profissional e de equipe começou para valer”, detalha.

Vôlei de praia

O ano era 1990 e Sandra, aos 17 anos e ainda uma juvenil, sonhava juntar-se às estrelas do Rio Forte no time adulto. 

“Com 17 anos eu jogava no time juvenil da Rio Forte e treinava no adulto também.  O Rio Forte tinha um time adulto muito bom, que disputava a Liga, bons salários e grandes jogadoras, como Marcia Fu, Heloísa Roese, Sandra Suruagy. A Mônica e a Adriana, que depois ganharam a prata no vôlei de praia em Atlanta, também passaram por lá. Conheci a Andreia e a Ângela, que eram duas irmãs, conheci a Janina, a Ana Richa... Passei por muitas jogadoras famosas e consagradas no time principal. Eu jogava no juvenil e sempre fazia o coletivo com o time adulto. Meu objetivo era jogar naquele time”, diz.

Mas não demorou muito para que Sandra atentasse para o tamanho do desafio que teria pela frente para disputar uma vaga na equipe principal com todas aquelas atletas famosas.

“Eu observei que as mulheres eram gigantes. A Márcia Fu parecia um armário. Eu tinha um físico realmente privilegiado, saltava muito, mas era difícil ficar o tempo todo competindo com essas mulheres tão altas. E naquela época não tinha líbero. Hoje a gente tem essa figura e um jogador mais baixo pode treinar perfeitamente e se destacar, como a Fabi e o Serginho, dois ícones do vôlei, que são muito baixos para os padrões atuais”.

Então, em 1993, após alguns anos de treinos no time do Rio Forte, Sandra recebeu um convite que mudaria pela segunda vez sua vida. Na verdade, foi esse convite que pavimentou o terreno para que ela se tornasse uma campeã olímpica. 

“Eu fui convidada pela Karina Lins e Silva, que foi minha primeira parceira, para jogar vôlei de praia. Ela também morava na Urca e então eu treinava com ela na Urca, no meu primeiro ano no vôlei de praia, em 1993. O meu auxiliar técnico do vôlei de quadra, o Jacques, estava treinando a Karina e me chamou. Foram eles que me convidaram para jogar vôlei de praia. Eles viram em mim características de uma jogadora de praia. Muito veloz, bom físico, saltava bem, era levinha, com explosão. Para a praia você tem que ter muito isso”, conta Sandra.
A partir desse momento, ela passou a dividir seu tempo entre os treinos em quadra e os trabalhos no vôlei de praia. 

“Comecei a treinar com a Karina para a praia. Eu treinava três períodos. No intervalo entre o juvenil e o adulto eu batia uma bolinha ali na praia, dentro da Urca mesmo. Comecei a gostar. Chegou uma hora que eu tive que definir, porque o treino é diferente e não dava para ficar fazendo a parte física para o vôlei de quadra e seguir jogando vôlei de praia. Apesar de ainda não terem tantas etapas, eu tinha que me liberar da quadra para jogar alguns torneios na praia, embora eles acontecessem mais no fim de semana. E eram bem poucos. Acho que só tinha seis etapas por ano”, recorda.

“Eu fui jogando com a Karina e adorei a praia. Já me destaquei logo no início. A gente entrou no ranking e nós competíamos com a Isabel e a Roseli, destaques da época. E eu e a Karina fomos muito bem. Era hora de escolher. Estava me achando muito baixa para jogar vôlei de quadra e adorando jogar dupla, num ambiente aberto. Era outra energia, uma liberdade que a quadra não oferece. Gostei daquilo e arrisquei”.

Jackie e Wantuil