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Bernardinho

MODALIDADE

Vôlei

DATA E LOCAL DE NASCIMENTO

28/08/1959 | Rio de Janeiro, RJ

JOGOS OLÍMPICOS

1980 | 1984

CONQUISTAS

2

Medalhas de Ouro

Jogos Olímpicos Atenas 2004 Jogos Olímpicos Rio de Janeiro 2016

4

Medalhas de Prata

Jogos Olímpicos Los Angeles 1984 Campeonato Mundial de Vôlei Buenos Aires 1982 Jogos Olímpicos Pequim 2008 Jogos Olímpicos Londres 2012

3

Medalhas de Bronze

Copa do Mundo de Vôlei Japão 1981 Jogos Olímpicos Atlanta 1996 Jogos Olímpicos Sydney 2000

Biografia

Bernardinho, caçador de evolução

Sempre inquieto, à beira da quadra, gesticulando muito e dando um show de caretas para demonstrar insatisfação, mesmo quando seu time está à frente no placar. Esta é a imagem emblemática de Bernardinho, cujo temperamento explosivo fornece matéria-prima vasta para a criação de inúmeros memes na internet.  

"A gente tem aquela imagem dele bravo, morde a camisa, morde a bola, está dando uma senhora bronca nos seus atletas, mas, ao mesmo tempo, não perde a linha de raciocínio dele. Ele aponta o erro, mas dá uma solução, tem um equilíbrio emocional para esses dois paralelos. Parece estar muito nervoso, mas, ao mesmo tempo, não perde a estabilidade e passa para os seus comandados a tática precisa para aquele momento. Ele tem aquele feeling da hora que tem que passar a mão na cabeça do atleta, da hora que tem que dar uma bronca; de saber diferenciar o atleta que suporta uma bronca um pouquinho mais forte daquele que não supera. Ele tem esse equilíbrio muito grande”, observa o vice-campeão olímpico William Carvalho, levantador e capitão da "Geração de Prata."

Foram essas características que levaram Bernardinho a oito participações em Jogos Olímpicos  – duas como atleta e seis como técnico. Ele soma duas medalhas de ouro, três de prata e duas de bronze, disputando quatro finais olímpicas consecutivas. Como poucos, garantiu o pódio nos dois naipes, e é o técnico mais vitorioso do Brasil. Seu segredo: trabalho duro e integridade. 

Talento e trabalho

Estereótipos à parte, Bernardinho é reconhecido por ter uma visão única do jogo, por ser perfeccionista e por acreditar que trabalho é a receita infalível para superar deficiências técnicas e também para transformar atletas talentosos em “virtuoses”. 

 “Eu devo muito do meu sucesso ao Bernardinho. Ele foi um treinador que acreditou em mim, no meu potencial, apesar de eu ter minhas limitações técnicas, de não ser uma jogadora talentosa. Como ele falava, eu era uma jogadora operária. Por meio de muito trabalho, de muita dedicação, consegui me tornar uma grande jogadora. Aprendi a recepcionar com ele, inclusive ganhando prêmio. Ele realmente foi um revolucionário no vôlei feminino e tem um lema que admiro muito e trouxe para a minha vida: a gente pode até perder uma partida, mas trabalhar, jogar, treinar mais que a gente, ninguém vai. Esse foi o grande diferencial dele, a perseverança, a habilidade de extrair o que cada um tem de melhor e contribuir para o grupo”, reconhece Virna, medalha de bronze em Atlanta 1996 e Sydney 2000 sob o comando de Bernardinho. 

“A importância dele na minha carreira foi total. Existe a Fernanda antes do Bernardo e a Fernanda depois do Bernardo, quando fui eleita a melhor do mundo várias vezes”, reforça a levantadora Fernanda Venturini, medalha de bronze em Atlanta 1996, que foi casada com Bernardinho por 21 anos. “Por ser mulher dele, ele pegava mais no meu pé como fazia com Bruninho (filho) também. Eu treinava mais que as outras”, pontua. 

“Fernanda é muito talentosa. Eu não podia pegar leve, ela tinha que ser talentosa e fazer mais do que as outras. É o que eu acredito: quem tem talento, tem que dar mais. Não posso cobrar 100% de quem tem menos talento, ele vai dar os 100% dele, que é menor do que o do outro. A Fernanda tinha muito talento, uma coisa incrível”, analisa o técnico, que tem duas filhas com a jogadora: Júlia e Vitória. 

Time de estrelas desde o início 

Bernardo Rocha de Rezende começou a praticar vôlei aos 11 anos, no Fluminense, “com um treinador excepcional” chamado Benedito da Silva, o Bené. O time contava com outros três astros da "Geração de Prata": Fernandão, Badalhoca e Bernard. 

“Foi o Bené que começou a me chamar de Bernardinho, para diferenciar do Bernard. Ele era um professor de vida, não tinha nenhuma formação acadêmica, mas era muito sábio. Meus pais conferiram a ele parte do tempo da nossa educação. Para você ver a importância que ele teve nas nossas vidas, os quatro irmãos jogaram com ele. Meu filho também. Só a minha irmã não jogou vôlei”, conta o carioca Bernardinho, que é o segundo filho do advogado tributarista Condorcet Pereira de Rezende e da dona de casa Maria Ângela Rocha de Rezende. 

 Nascido em 25 de agosto de 1959, ele treinou natação, judô, futebol e tênis, incentivado pelos pais, antes que o voleibol tomasse conta da sua vida e do seu coração. 

 “Não era só jogar, jogar era o final. O dia a dia, a disciplina, tudo aquilo que envolve o processo para mim é fascinante”, revela.         

Sonho olímpico 

Desde que começou a praticar esportes, o maior desejo de Bernardinho era disputar uma edição dos Jogos Olímpicos. Nos Jogos de 1980, o sonho se tornou real.  

“O desfile de abertura em Moscou tinha o ursinho Misha, que era o símbolo dos Jogos, naqueles painéis humanos, para dar boas-vindas. Ele chora no desfile de encerramento. Foi uma emoção única, a delegação vestida de blazer, nunca esqueço, era um blazer azul claro, com uma camisa de gola rolê amarela. Eu me lembro de tudo e mais alguma coisa”, suspira. “Eu não tinha talento para isso, mas já que eu estou aqui, vou aproveitar, né?”, pensava ele. O Brasil terminou a competição em quinto lugar.  

A geração de Bernardinho deu início à grande revolução do vôlei brasileiro. 

“Foi um privilégio ter participado de um time com tantos craques, pessoas realmente especiais, com um treinador talentosíssimo, que era o Bebeto de Freitas. Aquela geração capitaneada pelo Bebeto e pelo Nuzman, como dirigente, criou as condições para o voleibol se tornar o que ele se tornou, primeiro no masculino, depois no feminino, os passos foram dados em paralelo e a construção foi sendo feita. Ali o vôlei ganha popularidade nacional. O voleibol se tornou uma força nacional, de lotar ginásios e estádios. Em 83, nós jogamos uma partida para mais de 90 mil pessoas num Maracanã chuvoso. Maracanã, não Maracanãzinho! Isso demonstra um pouco da força que o vôlei ganhou”, celebra.  

Pela primeira vez no pódio olímpico 

Bernardinho voltou a uma edição de Jogos Olímpicos em Los Angeles 1984.  

“Quando eu comecei a jogar vôlei, o Bebeto era um ídolo meu. Na minha geração, tinha Renan, Bernard e Amaury, que eram três jogadores excepcionais. Aliás, toda aquela geração era excepcional: William, Montanaro... Era um grupo realmente de um talento incrível”, diz. 

 E foi ao lado dos ídolos que ele subiu, pela primeira vez, ao pódio olímpico. Derrotado pelos Estados Unidos, por 3 a 0, na final, o Brasil sagrou-se vice-campeão. Nascia ali a "Geração de Prata", reconhecida no mundo inteiro por seus méritos.  

“Talvez tenha faltado um pouco de maturidade, de experiência, de vivência olímpica. Aquela geração foi desbravadora, o Brasil nunca tinha chegado próximo ao pódio, o time desbravou e talvez tenha cometido erros.Talvez, depois de uma vitória contra os Estados Unidos na chave, tenhamos negligenciado um pouco a final, pois jogamos abaixo do que poderíamos”, diagnostica.  

Nascido para ser treinador 

Inteligente, observador, líder por natureza, como ressaltam os amigos, Bernardinho sempre foi capitão nos times em que jogou, desde as categorias de base. Durante todo o tempo em que esteve na seleção, foi reserva do capitão William, mas manteve suas características de liderança. 

“Eu joguei muitos anos com o Bernardo no clube e na seleção brasileira, até mesmo voleibol de praia. Era um cara que enxergava, desde lá, o jogo de forma diferente. Foi um grande atleta, mas, acima de tudo, ele tinha um poder de liderança dentro de todas as equipes em que jogou e na seleção também. Mesmo não sendo o capitão, ele era um dos caras que liderava a equipe, de uma forma brilhante. Sempre deu sinais, desde de jovem, de que seria um grande treinador, um grande gestor”, declara o vice-campeão olímpico Renan Dal Zotto, que assumiu a seleção masculina quando Bernardinho saiu. 

 “O Bernardo nunca foi um atleta com muita habilidade, mas treinava muito. Na minha opinião, superava tudo porque tinha muita visão de jogo e conhecimento tático, fazia a distribuição certa para os seus jogadores, com isso fazia a diferença. Era impressionante o que ele treinava e conhecia do jogo”, detalha o capitão Wiliam. “Naquela época, ele já se apresentava como um grande treinador. O levantador já leva uma grande vantagem, porque conversa muito com os seus treinadores e todas as bolas passam pelas suas mãos. É ele que tem que ter a consciência tática, de fazer a distribuição certa, e isso ele tinha. Eu achava que ele seria um grande técnico, mas ninguém imaginava que ele iria se tornar o que se tornou, a grandeza de treinador a que ele chegou”, completa. 

Dirigindo jogadoras na Itália 

Em 1986, Bernardo se aposentou da seleção, mas continuou jogando no clube. Em 1988, foi convidado para ser assistente técnico de Bebeto de Freitas nos Jogos Olímpicos de Seul. Em 1989, estreou como técnico num time feminino da Itália.  

“A gente ainda estava casado quando a Dulce Thompson, que jogava na Itália e tinha jogado comigo durante muitos anos na seleção e na Supergasbrás, chamou o Bernardo para ser técnico lá em Perugia. Ele foi e conseguiu salvar o time. Acho que a partir dali ele entendeu... Eu achei que poderia ser uma coisa boa, porque ele já estava no final de carreira como jogador e não estava feliz. Ali foi uma grande chance, uma oportunidade que ele abraçou e começou a se desenvolver muito bem”, compartilha Vera Mossa, ex-mulher de Bernardinho, mãe do levantador Bruninho e atleta olímpica nos Jogos 1980, 1984 e 1988. 

“Eu já era pai do Bruno e precisava trabalhar. Na seleção não tinha salário. Se eu queria viver do vôlei, precisava arrumar uma coisa para fazer e realmente trabalhar, por isso fui para a Itália”, explica o técnico, que ficou no time feminino por dois anos e meio e depois se transferiu para uma equipe masculina, onde permaneceu por um ano.  

Presente nos Jogos  Olímpicos de Moscou, Los Angeles e Seul, ele assistiu às competições de Barcelona 1992 pela televisão.  

“Quem é esse louco?” 

Bem-sucedido na Itália, Bernardinho foi convidado por Carlos Arthur Nuzman, então presidente da Confederação Brasileira de Vôlei, para assumir a seleção feminina em 1993. 

 “A equipe vinha de uma derrota no Sul-americano, eu assumi, e a gente nunca mais perdeu um Sul-americano, onde tinha aquele trauma do Peru”, lembra. “Elas tinham ficado em quarto nos Jogos de 92, uma geração boa, muito talentosa, com Fernanda Venturini, Ana Moser, Marcia Fu, Ana Paula, uma bela geração. Era uma grande oportunidade”, emenda.   

O novo técnico promoveu inúmeras mudanças, incluindo nova metodologia de trabalho, filosofia de time em primeiro lugar, valorização do grupo, treinamento físico, estratégico, velocidade, bolas de fundo... 

 “Começaram a se estabelecer coisas que não eram padrões no feminino. Eu trouxe profissionais da área de preparação física para mudar o patamar de preparação. Atleticamente, nós precisávamos crescer e isso foi algo que nós fomos buscar, um padrão diferente naquele momento”, detalha o técnico, ressaltando que, no início, enfrentou certa resistência por parte das meninas: “Quem é esse louco que vem com trabalho, intensidade, cobrança?”, supõe sobre o pensamento da equipe. 

Assustador 

 Além das novas exigências, o temperamento de Bernardinho também assustou o time. 

 “Foi muito difícil lidar com o jeito dele porque era uma situação que a gente não conhecia, um técnico que tinha esse comportamento para dirigir uma equipe, ainda mais uma equipe feminina, assustou muito. Existiu uma barreira muito grande de aceitação mesmo. A gente falava: 'Ele é maluco!' Mas a gente via que o que ele fazia tinha sentido, que ele seguia uma metodologia, e acabou se adaptando. O que eu acho mais interessante nesse jeito dele é que essa exigência dele é no treinamento também. Mas confesso que no início foi bastante assustador”, divide a levantadora Fofão, que disputou cinco Jogos Olímpicos e contabiliza duas medalhas de bronze - Atlanta 1996 e Sydney 000 – e uma de ouro – Pequim 2008. 

Fazendo história com as meninas 

O primeiro grande desafio dos métodos de Bernardinho foi o Campeonato Mundial, disputado no Brasil, em 1994. A melhor colocação brasileira até então fora o quinto lugar, em 1960, também no Brasil. As meninas chegaram muito bem preparadas, tanto física quanto mentalmente. Já na primeira convocação, o treinador avisara que para disputar com as fortes russas e cubanas as brasileira teriam de ganhar massa muscular e teve a fundamental ajuda do preparador físico José Inácio Salles.  

A seleção fez uma campanha praticamente irretocável, chegando invicta à semifinal contra a Rússia, defensora do título. Depois de estar perdendo por 2 a 1, com apoio de uma torcida enlouquecida, veio a virada no tie-break e a sonhada vaga na final. A decisão foi contra um dos melhores times da história do vôlei feminino: Cuba de Mireya Luiz, Regla Bell, Regla Torres e cia. As cubanas chegaram à final sem perder um set e conquistaram o título que marcou o início de uma hegemonia de anos no esporte.  

À época, o jornal O Globo revelou que as brasileiras tinham apelidado o treinador de Karpolzinho, numa alusão a Anatoly Karpol, o técnico russo multicampeão e conhecido pelas broncas homéricas que dava nas jogadoras à beira da quadra. “Se eu ganhar a metade do que ele ganhou já terá sido ótimo”, disse Bernardinho sem se importar com a comparação. 

Apesar do apelido, as meninas da seleção tinham verdadeira devoção ao jovem treinador, como fica clara na declaração de Márcia Fu: “Se o Bernardo mandar a gente bater a cara na parede no treino, nós batemos, porque sabemos que dará resultado”. 

A fantástica geração cubana foi uma pedra no tênis das brasileiras nos anos seguintes. Nos Jogos Olímpicos Atlanta 1996, a expectativa era chegar à final, mas a estratégia traçada não deu certo. O Brasil estava na mesma chave de Cuba, a grande favorita, e o plano era ir vencendo as partidas e terminar a etapa classificatória em primeiro ou em segundo, para cruzar com Cuba novamente apenas final.  Na fase eliminatória, as brasileiras venceram todas as partidas, inclusive contra Cuba, por 3 a 0, quebrando a invencibilidade do time. Porém, as cubanas começaram mal e terminaram em terceiro lugar. Com isso, Brasil e Cuba acabaram se enfrentando novamente na semifinal, e as adversárias levaram a melhor. 

“Fizemos dois a um, com chance de fechar o jogo. Elas venceram o terceiro, o quarto set, o tie break e levaram. Foi uma final antecipada, foi terrível! Menos de 48 horas depois, o time tinha que voltar à quadra, após uma derrota tão dura, para ganhar da Rússia. E foi duro, como foi duro! Foi 3 a 2 a fórceps, mas conseguimos”, destaca Bernardinho.   

“No dia seguinte à semifinal, ele reuniu a equipe e falou: 'A nossa seleção não merece sair daqui sem uma medalha, por tudo o que foi feito, pelo trabalho, a gente tem que entrar em quadra amanhã porque a gente vai para lá, não para buscar a medalha de bronze, a gente vai buscar a medalha de ouro' Ele falava com sangue no olho. Aquilo ali foi o diferencial, ele ganhou o grupo. E quando a gente entrou na quadra foi realmente para buscar o ouro. Acredito que, talvez, se a gente tivesse se sentido derrotada no jogo contra Cuba, depois nós não conseguiríamos esse feito para o vôlei feminino, que era trazer a primeira medalha olímpica tão merecida. Ele foi fundamental nessa conquista”, diz Fofão.  

Um bronze inédito. As meninas do Brasil estavam no pódio olímpico pela primeira vez. Embora tenha entrado para a história como o técnico da equipe que conquistou a primeira medalha olímpica do vôlei feminino, Bernardinho desvia o foco de si mesmo.  

“Eu não sou afeito a esses marcos, tenho uma memória especial por ter estado com essas meninas. A medalha do treinador é poder observar a equipe lá em cima, a bandeira subindo, elas ali perfiladas. Esse é o grande marco para mim” diz. 

Cuba de novo, bronze de novo